Metade das profissionais brasileiras dizem estar, hoje, vivendo níveis maiores de estresse do que um ano atrás, enquanto longas horas de trabalho impactam negativamente suas rotinas, e estigmas relacionado às saúdes mental e menstrual persistem. Essa é uma das conclusões da pesquisa Woman @ Work 2024, realizada pela Deloitte, organização com o portfólio de serviços profissionais mais diversificado do mundo, em dez países – incluindo o Brasil.
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Segundo o estudo, 53% das profissionais brasileiras relatam que seus níveis de estresse aumentaram em relação ao ano anterior, número em linha com a média global, de 50%. As mulheres brasileiras pertencentes a grupos étnicos minoritários apresentam níveis de estresse ainda mais elevados, chegando a 56%, mas apenas 28% deste grupo relatam obter apoio adequado de seus empregadores, enquanto 22% se sentem confortáveis para discutir a saúde mental no local de trabalho – indicadores inferiores aos registrados pela amostra geral de mulheres no Brasil (37% e 28%, respectivamente) e pela média global (43% e 33%).
A quantidade de entrevistadas brasileiras que declara ter tirado tempo fora do trabalho no último ano por motivos de saúde mental (34%) se aproxima do quantitativo global (33%). No entanto, as brasileiras estão menos propensas a falar sobre a própria saúde mental no ambiente de trabalho (apenas 28% disseram se sentir confortáveis) do que as entrevistadas no mundo todo (33%). A quarta edição do relatório também faz uma relação entre as horas de trabalho e o bem-estar psicológico. O relatório mostra que, enquanto na média global e no total da amostra brasileira 1/5 das entrevistadas dizem trabalhar a mais do que o contratado, entre as brasileiras que pertencem a grupos étnicos minoritários o volume é de quase 1/3 das entrevistadas (29%).
O estudo revela que muitas brasileiras continuam a trabalhar mesmo sofrendo quadros de dor, desconforto ou outros sintomas: as entrevistadas que vivenciaram problemas relacionados à saúde feminina relataram ter passado por altos níveis de desconforto devido à menstruação (40%) ou menopausa (27%) e ter trabalhado mesmo assim, sem tirar licença. Ao todo, mais de um quarto das mulheres brasileiras relatam ter enfrentado desafios relacionados à menstruação (15%), menopausa (10%) ou fertilidade (3%). Sobre a fertilidade, 21% afirmam que reportaram esse fator como motivo para tirar licença aos seus empregadores e tiveram impacto negativo na carreira.
Muitas vezes, as mulheres relutam em discutir essas questões no local de trabalho. Entre as brasileiras que tiraram folga por problemas de saúde relacionados à menstruação (14% da amostra total), menopausa (10%) ou fertilidade (7%) e não revelaram o motivo ao seu gestor, 33% dizem que não se sentiram confortáveis para falar de assuntos pessoais; 23% afirmam que assuntos relacionados a menstruação, menopausa ou fertilidade são muito incômodos para serem discutidos no ambiente profissional e 20% se dizem preocupadas sobre falar desses temas e ter um impacto negativo no desenvolvimento da própria carreira.
Home office x trabalho híbrido
As experiências de trabalho híbrido estão melhorando, mas algumas mulheres dizem ter tido que ajustar suas vidas profissionais e pessoais após a introdução de políticas de retorno ao escritório. Entre as brasileiras que voltaram a trabalhar presencialmente em tempo integral, 26% relataram impacto na saúde mental e aumento nos níveis de estresse. Sobre a produtividade, 16% das entrevistadas no Brasil disseram que o rendimento no trabalho caiu e 14% consideram um impacto negativo no cumprimento das responsabilidades de cuidado. Ainda no mesmo cenário de retorno ao trabalho presencial em tempo integral, 17% das brasileiras afirmaram que a medida impactou negativamente no sentido financeiro e 27% tiveram de mudar de casa para atender às novas expectativas. Menos mulheres no Brasil estão enfrentando exclusão em ambientes de trabalho híbridos (33%) em comparação com o ano passado (48%), e as entrevistadas relatam melhores experiências com flexibilidade (29% em 2024, contra 42% em 2023) e previsibilidade (31% em 2023, ante 39% em 2023) em seus padrões de trabalho.
Assédio sexual e microagressões
As mulheres seguem se sentindo inseguras no local de trabalho, assim como comportamentos não-inclusivos insistem em se repetir. No Brasil, 49% das mulheres estão preocupadas com sua segurança no ambiente profissional, durante o trajeto ou em viagens à trabalho. Sobre o que as fazem se sentir mais inseguras neste contexto, as entrevistadas afirmam que lidam com clientes que já as assediaram ou se comportaram de uma forma que as fizeram se sentir desconfortáveis (24%); o trabalho está em um local inseguro, onde acreditam que poderiam ser assediadas ou atacadas (18%); já foram assediadas por um colega de trabalho, incluindo assédio sexual ou perseguição (13%); já foram assediadas enquanto viajavam a trabalho, incluindo assédio sexual (13%).
No último ano, mais de um terço (35%) das profissionais brasileiras relataram ter sofrido microagressões, contra 31% na pesquisa global. Situações de assédio sexual somam 4% entre as brasileiras e 4% globalmente, e outros tipos de assédio chegam a 8% nos dois cenários – brasileiro e global. No entanto, esses comportamentos, frequentemente, não são relatados: 40% das mulheres brasileiras que sofreram assédio sexual não reportaram o caso à sua organização; e 77% que vivenciaram microagressões também optaram por não denunciar.
Carga de trabalho doméstico
No Brasil, 22% das mulheres que vivem com parceiros são a principal fonte de renda da família. Mesmo convivendo com um parceiro, são as mulheres que têm a maior responsabilidade pelo cuidado infantil e, cada vez mais, pelo cuidado de outros adultos. A maioria das entrevistadas brasileiras (68%) é a principal responsável pelos cuidados das crianças, enquanto 40% são as principais responsáveis pelo cuidado com outros adultos. Na pesquisa global, esses números são menores: 48% e 32%, respectivamente. Sobre a limpeza e outras tarefas domésticas, 43% das brasileiras assumem a responsabilidade sozinhas, 25% relataram uma divisão igual e 23% pagam por esse serviço. Globalmente, 36% das mulheres afirmam assumir a responsabilidade sozinhas, 21% dividem igualmente e 23% pagam pelo serviço. A pesquisa global também aponta o impacto das responsabilidades domésticas na saúde mental: mulheres com a maior parcela de responsabilidade doméstica têm muito menos probabilidade de relatar boa saúde mental do que outras.
“O estudo mostra que a carga de trabalho doméstico que recai desproporcionalmente sobre as mulheres é uma questão que exige atenção imediata. Embora algumas mulheres possam dividir tarefas com seus parceiros, a realidade é que a maioria ainda carrega a responsabilidade de cuidar dos afazeres domésticos, das crianças e, muitas vezes, de adultos. Esses pontos sobrecarregam as mulheres e contribuem, significativamente, para o estresse e a exaustão. Precisamos de políticas e práticas que promovam uma distribuição mais equitativa dessas responsabilidades”, afirma Aline Vieira, sócia sponsor do Delas, pilar de gênero da estratégia DE&I da Deloitte.
Flexibilidade x jornada de trabalho
Os dados revelam que flexibilidade e equilíbrio entre trabalho e vida pessoal são essenciais para que um funcionário permaneça na organização. No Brasil, mulheres que estão atualmente considerando deixar seu empregador por outra empresa citam a falta de flexibilidade nos horários de trabalho (26%) e salário e pacote de benefícios não competitivo (26%) como os principais motivos. Já as brasileiras que deixaram seu empregador no último ano citam remuneração inadequada (24%), mau equilíbrio entre trabalho e vida pessoal (18%) e falta de oportunidade de aprendizado e desenvolvimento (18%).
Sobre a igualdade no ambiente corporativo, apenas 12% das mulheres brasileiras acreditam que a empresa onde trabalham toma medidas concretas para cumprir o seu compromisso com a diversidade de gênero. No Brasil, 27% delas dizem que não querem progredir para uma posição de liderança sênior dentro de sua organização. Desse total, 20% afirmam não gostar da cultura dentro da empresa, 19% dizem não ter planos para continuar na organização por tempo suficiente para progredir a uma posição senior e 19% dizem não acreditar que terão oportunidade de chegar a uma posição senior.
Em nível global, 14% das entrevistadas acreditam que os direitos das mulheres se deterioraram no seu país de origem durante o último ano. O número sobe para 17% no Brasil. As mulheres brasileiras estão mais preocupadas com os direitos das mulheres (52%), sua segurança pessoal ao viajar para/ao trabalho (49%) e financeira (48%).
O estudo global ouviu 5.000 mulheres em 10 países. No Brasil, foram 500 profissionais de organizações que fazem parte de diferentes indústrias, como: Serviços Financeiros; Serviços de Negócios; Consumo; Energia, Recursos e Industriais, Ciências da Vida e Cuidados com a Saúde; Tecnologia, Mídia e Telecomunicações; Governo e Serviços Públicos. As respondentes brasileiras têm entre 18 e 64 anos e quase metade (43%) ocupa cargos não-gerenciais. Os dados foram coletados entre outubro de 2023 e janeiro de 2024.
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