Entrevista da SemanaEspeciais

Governos alinhados com a transformação digital

A ABEP (Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Tecnologia da Informação e Comunicação) e o CONSAD (Conselho Nacional de Secretários de Estado de Administração) uniram esforços para lançar o GTD.Gov (Grupo de Transformação Digital dos Estados e DF), uma rede nacional que reúne especialistas de todo o País.

Pela primeira vez no Brasil, as áreas de gestão, negócio e TIC dos estados se unem em torno de uma pauta: olhar a transformação digital tanto sob a óptica dos negócios de governo quanto pela da tecnologia, com prioridade para a experiência dos usuários dos serviços públicos.

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Lutiano Silva, presidente do Centro de Gestão da Tecnologia da Informação do Amapá (PRODAP-AP)

Lutiano Silva, presidente do Centro de Gestão da Tecnologia da Informação do Amapá (PRODAP-AP)

Até o final de 2019, o grupo pretende entregar a todos os governadores um documento contendo recomendações de transformação digital para os estados que poderão ser replicadas para os municípios. Nesta entrevista, Lutiano Silva, presidente do Centro de Gestão da Tecnologia da Informação do Amapá (PRODAP-AP) e presidente executivo da ABEP, e Thiago Ávila, superintendente de Produção da Informação na Secretaria de Planejamento de Alagoas (SEPLAG-AL) e coordenador do GTD.Gov, falam sobre os objetivos do grupo, o status da transformação digital no setor público e os caminhos para inovar.

Por que criar um grupo de trabalho para discutir transformação digital no setor público? Quais são os objetivos do grupo?

Thiago Ávila, superintendente de Produção da Informação na Secretaria de Planejamento de Alagoas (SEPLAG-AL) e coordenador do GTD.Gov

Thiago Ávila (TA) – O Grupo de Trabalho Conjunto para a Transformação Digital nos Governos Estaduais e Distrital (GTD.Gov) possui um foco: avaliar os impactos e construir soluções e encaminhamentos para a transformação digital nas esferas estadual e distrital da administração pública brasileira e atuar como um instrumento de geração de valor ao serviço público, bem como de otimização da inteligência das atividades e do custo do poder público. Criamos este grupo por entender que os governos estaduais e o distrital possuem características específicas, bem distintas das características da União e dos municípios no âmbito do modelo federativo do Brasil, e que requerem foco e atuação específica.

Quais são as primeiras ações e quais os resultados conquistados pelo GTD.Gov até agora? Existe algum exemplo prático para citar?

TA – A formação do grupo, que inicialmente contava com cerca de 20 especialistas de 11 unidades federativas e atualmente conta com mais de 60 especialistas de 16 unidades federativas, é o primeiro grande resultado. Reunimos um time forte de especialistas (servidores, empregados públicos e colaboradores) com capacidade técnica e institucional para viabilizar a transformação digital nos estados e DF. Geramos grandes entregas entre a primeira reunião, no fim de maio, e a segunda, no final de agosto de 2019. Sabemos que a transformação digital em todos os estados do Brasil e DF tem condições muito maiores de se tornar uma realidade com impacto e benefícios para os brasileiros. Também ressalto que o desenvolvimento da Estratégia Nacional de Saúde Digital e a plataforma Meu DigiSUS serão bastante acelerados, pois todas as demais unidades federativas estarão acompanhando o desenvolvimento desta estratégia a partir do projeto-piloto e se preparando para poder operacionalizar este grande projeto com a máxima rapidez e impacto, mediante o cronograma a ser estabelecido pelo Ministério da Saúde, DATASUS, Conselho Nacional dos Secretários de Saúde Estaduais (CONASS) e Municipais (CONASEMS) e demais instituições envolvidas.

Lutiano Silva (LS) – Além das ações de fortalecimento do compartilhamento de experiências e conhecimentos entre os governos estaduais, academia e mercado sobre a pauta da Transformação Digital (TD) e o Governo Digital (GD), o GTD.Gov passa a se posicionar como um ente estratégico para fortalecer a pauta política e estratégica de TD/GD nos estados e também no âmbito nacional, com a interface com o governo federal.

Como se traduz “a lógica da transformação digital” quando pensamos em governo?

TA – Esta lógica aplicada ao setor público é conhecida como governo digital. Trata-se de: (1) identificar e catalogar a oferta de serviços ao usuário conforme determinado pela Lei Federal 13.460/2017 e legislação correlata; (2) identificar os serviços passíveis de eliminação ou fusão com outros serviços existentes; (3) identificar os serviços passíveis de simplificação, desburocratização e transformação digital; (4) reformular o modus operandi destes serviços, incorporando novos conceitos, métodos e tecnologias; (5) testar, validar e disponibilizar tais serviços ao usuário do serviço público e (6) disponibilizar mecanismos de pós-serviço que permitam que o usuário avalie o serviço continuamente, visando ao seu aprimoramento, ou, ainda, que o usuário se manifeste (reclame, elogie, denuncie) sobre o serviço por meio das ouvidorias. Tudo isto se baseia em uma estrutura inteligente de identificação digital do cidadão, segurança jurídica e técnica na tramitação de procedimentos e proteção dos dados pessoais.

Neste contexto, é fundamental que o Estado entenda qual é a jornada do usuário para cada serviço público, tornando-a inteligente e relevante para o cidadão. Esta jornada não deve ser apenas uma obrigação para com o Estado, mas um dever cívico em uma sociedade democrática e desenvolvida.

Qual é a maturidade do governo quando falamos em transformação digital? Que tipo de projetos estão avançados e onde ainda há muito para evoluir?

LS – O governo federal vem evoluindo muito rapidamente em matéria de transformação digital. Está desenvolvendo projetos de alto impacto, como a Estratégia Nacional de Saúde Digital, a Identificação Civil Nacional, o login único gov.br, o portal gov.br, a plataforma digital do INSS, entre outros inúmeros casos. O desafio está nos governos subnacionais, em nível estadual e distrital e principalmente no nível municipal. O estágio de maturidade é variado e alvo de estudo do GTD.Gov para que sejam identificadas, mediante uma pesquisa específica, as capacidades de governança para a transformação digital. Destaco que esta diversidade relacionada à governança da transformação é um dos principais motivadores para a criação do grupo.

Há orçamento para a transformação digital no Brasil?

LS – Em partes. Existem ações orçamentárias voltadas para projetos com características digitais, mas que necessariamente não são comprometidos com a transformação dos negócios e da cultura organizacional, que é preconizada pela transformação digital. A governança orçamentária e financeira para projetos de digitalização é um dos pilares estratégicos de uma boa governança para a transformação digital e passa inicialmente pela clareza dos níveis estratégicos para distinguir o que é daquilo que não é transformação digital e, especialmente, quais impactos e resultados são esperados.

Por que a oferta de serviços eletrônicos é importante para a população?

TA – Em uma sociedade digital, o usuário deseja acessar os serviços de qualquer lugar e por diversos dispositivos. Tudo o que o usuário não deseja é se deslocar para uma unidade de atendimento presencial, enfrentar fila e perder boa parte do seu dia para ter acesso a um serviço, seja ele público ou privado. O custo do serviço presencial é extremamente alto, pois envolve despesas com servidores para pré-atendimento, despesas prediais (aluguel, energia, telefonia, água, limpeza, internet, etc.) com a estrutura das unidades de atendimento, mobiliário, equipamentos e gasto de tempo, dada a burocracia nos procedimentos. Além disso, o atendimento presencial costuma obrigar o usuário a se dirigir à unidade do governo mais de uma vez, o que lhe impõe custos com deslocamento e outras despesas e desperdiça seu tempo útil para atividade laboral. O serviço digital elimina a grande maioria destas despesas do Estado e do cidadão e ainda oferece um serviço de alto valor agregado e que pode ser avaliado pelo usuário para que o Estado possa aprimorá-lo continuamente. Todavia, é preciso que haja todo um arcabouço legal e de segurança para a oferta do serviço digital, iniciando-se por uma estrutura robusta de identificação dos usuários e validade jurídica dos atos digitais. O cidadão é digital, os serviços estão sendo digitais e o Estado também precisa ser digital.

Uma das buscas do governo é reduzir a burocracia e ganhar eficiência de forma geral. A transformação digital pode ser uma aliada nesta batalha? Como?

TA – A literatura apresenta que o custo de um serviço digital é 97% menor que o de um serviço presencial. O governo de Minas Gerais calcula que, em média, cada serviço presencial custa R$ 17,00, enquanto um serviço digital custa R$ 0,50. Em cenários de restrição fiscal, o investimento em transformação digital é um dos melhores caminhos para redução do custo do Estado. Com a transformação digital, diversos documentos que eram exigidos do cidadão ou serão digitais ou simplesmente deixarão de existir. Um exemplo é a carteira de trabalho. Com sua versão digital, ela deixou de ser um documento e passou a ser um meio de controle e de acesso do trabalhador a seus direitos e deveres trabalhistas. A legislação vigente, especialmente a Lei Federal 13.726/2018, determina que o Estado deve ser racionalizado e simplificado. A transformação digital é a maior aliada para que o Estado tenha um serviço inteligente, inovador e de alto valor agregado.

Há estudos, locais ou internacionais, sobre a redução de custos que a digitalização gera para os governos e para os cidadãos?

LS – Em 2017, a ABEP-TIC contratou um estudo sobre o impacto de investimento em TIC pública nos estados. Ele aponta que cada R$ 1,00 investido em TIC reduz em R$ 9,42 os gastos do governo. Outro número indicado pela pesquisa é o impacto direto no Produto Interno Bruto dos estados: para cada 1% de aumento de investimentos dos governos em TIC, o PIB aumentará 0,058%. A pesquisa teve como referência o artigo norte-americano “Os orçamentos de TI explicam o tamanho dos governos?”, publicado na Management Science, além de conceitos da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) que priorizam o uso da tecnologia em áreas como Educação e Saúde. Entrevista originalmente publicada na revista Cisco Live Magazine

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