Ponto de Vista

Criação de um novo negócio: projeto ou operações?

A criação de um novo negócio exige muito mais do que uma boa ideia. É sobre o que fala, neste artigo, Armando Terribili Filho, da Faap.

A indagação é relativamente comum entre estudantes de graduação e pós-graduação, se a criação de um novo negócio deve ser tratada como um Projeto ou como Operações. A dúvida é pertinente, pois há características em comum em um Projeto e Operações: em primeiro lugar, ambos são executados por pessoas, exigindo atividades de planejamento, controle e monitoração; e em segundo lugar, ambos têm recursos escassos, sejam materiais, logísticos, financeiros e humanos.

Projeto é algo finito em termos de tempo, gerando algo único, enquanto que Operações são processos repetitivos e contínuos, exigindo monitoração das atividades que compõem os processos. Assim, de forma conclusiva pode-se afirmar que a “criação de um novo negócio” é um projeto, tendo como escopo principal a criação da organização. Em contrapartida, a partir da criação da organização, ela passa a existir de modo “ad eternum”, ou seja, transformando-se em Operações, visando sua sustentação no mercado em que atua.

A criação de um novo negócio exige em primeiro lugar uma boa ideia, preferencialmente algo novo, diferente e que vá ao encontro de necessidades e desejos dos potenciais clientes. Uma boa ideia é condição necessária, mas não é suficiente para o sucesso do novo negócio. Ademais, deve-se procurar “ouvir” seus futuros clientes através de pesquisas, para que não se crie vieses de entendimento com base em estereótipos e pré-conceitos. Lembro-me que, há alguns anos atrás, orientava um TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) e os graduandos afirmavam que as pessoas acima dos 40 anos de idade preferiam comprar vegetais, frutas e verduras nas feiras livres, pois temiam efetuar compras pela Internet, pois não tinham familiaridade com as novas tecnologias. Que engano! Após entrevistar mais de 400 pessoas, estes saudosos alunos descobriram que as pessoas com mais de 40 anos gostam de ir à feira livre para se relacionar socialmente. Aliás, em geral, frequentam as mesmas feiras e nos mesmos horários, estabelecendo relacionamentos com feirantes e outros clientes, no que tange a receitas culinárias, remédios caseiros, indicação de médicos e “as tradicionais simpatias”… Adicionalmente, descobriram também, que estas pessoas (acima de 40 anos) são frequentes compradores por meios eletrônicos: passagens aéreas, hotéis, utilidades domésticas, presentes de casamentos, etc. Assim, a ideia original do novo negócio precisa ser confrontada com o potencial cliente para teste de validação e consistência. Realizar uma pesquisa de mercado é útil, porém pode ser custoso, dependendo do tamanho da amostra e caso se contrate um instituto de pesquisa para realizá-la. Há diversas técnicas de pesquisa, incluindo pesquisas quantitativas, qualitativas, grupo focal, etc.

Outro recente trabalho de TCC tinha como alvo o lançamento de um queijo italiano (grana padano) em embalagens individuais para consumo em academias, salas de aula, no trânsito ou assistindo TV. Algo relativamente comum em algumas regiões da Itália. Este orientando importou o queijo e foi à Avenida Paulista, em São Paulo. Lá, em companhia de uma profissional, montou uma mesinha devidamente estruturada e oferecia pequenas porções desse queijo aos pedestres, para que degustassem e opinassem acerca do sabor, consistência, índice de sal, textura, formato do queijo, condições da embalagem, etc. O resultado desta pesquisa quantitativa foi impressionante, pois “ouvia” do seu potencial cliente o que lhe agradava, se consumiria o queijo, em quais locais e qual seria o preço que estaria disposto a pagar. Outra estratégia de pesquisa utilizada para elaboração deste TCC foi “ouvir” casais amigos. Desta vez, idealizou-se um grupo focal (focus group) e foi promovida uma reunião. Nesta reunião, em ambiente descontraído e informal, foi oferecido o queijo acompanhado de vinhos e cervejas, para que degustassem e opinassem acerca das melhores combinações de olfato e paladar para com o grana padano.

Concluída a pesquisa de mercado, pode-se dizer que o primeiro passo do projeto “criação de um novo negócio” está concluído, pois sua ideia passou pelo crivo (pesquisa de mercado) com seus potenciais clientes, aprovando-a ou identificando potenciais modificações na sua ideia original.

O segundo passo é definir claramente seu produto/serviço e investigar a legislação vigente na área, pois certamente há particularidades. Por exemplo, um projeto de criação de um consultório odontológico deve contemplar uma série de exigências da Vigilância Sanitária, incluindo e não se limitando a: controle de esterilização de materiais utilizados, coleta especial de lixo, controle de validade de medicamentos e materiais de trabalho, entre outros itens. Para as áreas de alimentação, entretenimento e saúde há legislações específicas envolvendo aspectos de segurança, de higiene, de descarte e até mesmo de layout do local, que precisam ser rigorosamente observados para manter a qualidade do serviço/produto oferecido, ou mesmo garantir o atendimento a normas específicas do segmento de atuação.

Ainda no passo 2 cabe ao empreendedor efetuar três análises distintas, através de técnicas amplamente disseminadas no mercado. A primeira é a Análise SWOT, que tem origem nas palavras inglesas Strenghts, Weaknesses, Opportunities e Threats, que significa os pontos fortes, fracos, ameaças e oportunidades de seu negócio. Os pontos fortes estão associados às competências, habilidades, vantagens que seu negócio tem diante da concorrência, enquanto que os pontos fracos são características internas deficientes da organização. Entre os pontos fortes e fracos, pode-se mencionar, recursos financeiros (capital de giro), logística, know-how, estrutura da organização, imagem da organização e gestão. Lembre-se que os pontos fortes e fracos estão associados ao passado e presente. Por outro lado, as oportunidades e ameaças estão ligadas ao futuro e são fatores externos (e tendências) que podem impactar a organização, trazendo vantagem competitiva (oportunidades) ou freando o desenvolvimento da organização (ameaças).

A segunda avaliação é a análise das 5 Forças de competividade de Porter: rivalidade entre os concorrentes, ameaça de novos entrantes, poder de barganha dos fornecedores, poder de barganha dos clientes e ameaça de produtos substitutivos. A realização desta avaliação permitirá identificar características e vulnerabilidades do novo negócio no mercado. Por exemplo, se a força “novos entrantes” é intensa, isto representa que se trata de um segmento ainda não saturado, com possibilidade de outros concorrentes ainda se estabelecerem, aumentando a concorrência. O poder de negociação de fornecedores indica o quão dependente seu negócio é dos fornecedores, ou seja, quanto mais fornecedores sua organização possuir, maior liberdade de escolha e negociação terá; em contrapartida, a existência de poucos fornecedores pode trazer à organização alguns riscos de elevação de preços e/ou desabastecimentos. De modo análogo, o poder de negociação dos clientes sinaliza se o segmento atua com poucos e fortes clientes, ou não. A força “ameaça de produtos substitutivos” é talvez uma das mais importantes, pois evidencia o quão o produto/serviço pode ser substituído no mercado. Exemplos disso são os disquetes, os nostálgicos discos de vinil, carburadores, os filmes fotográficos, etc.

A terceira e última análise é a PEST (Política, Econômica, Social e Tecnológica). No aspecto político deve-se analisar se o produto/serviço está sujeito a intervenções do governo no que tange a políticas fiscais, regras de proteção ao meio ambiente, regras de segurança, taxas alfandegárias. Em termos econômicos, devem se consideradas as condições da economia que podem impactar a escolha da estratégia da organização, como: estabilidade monetária, políticas de importação/exportação, taxa de inflação, custos do trabalho e outros. As variáveis sociais incluem mudanças no estilo de vida das pessoas, moda, distribuição de renda e outros que podem impactar o novo negócio. Finalmente, as variáveis tecnológicas podem fazer surgir novos produtos/serviços tornando os atuais rapidamente obsoletos.

Com base na análise SWOT, 5 Forças de Porter e Análise PEST o empreendedor pode reavaliar seu produto/serviço, definir novas estratégias, estabelecer planos de ação, ou mesmo desistir de criar o novo negócio.

Na próxima semana teremos a continuidade do tema, quando serão abordados os passos seguintes: criação do plano de marketing; definição da estrutura da organização, incluindo o organograma, funções e responsabilidades; projeções financeiras que amparam o estudo de viabilidade econômico-financeira, análise de riscos e características da operação, e finalmente, o sumário executivo e as possíveis fontes de financiamento. Até lá!

(*) Armando Terribili Filho (PMP) é doutor em Educação pela UNESP, mestre em Administração de Empresas e docente na FAAP em cursos de graduação e pós-graduação. Coordenador e professor do curso de extensão de “Novos Negócios” da FAAP. Certificado pelo PMI (Project Management Institute) e com vasta experiência como executivo em gerenciamento de projetos em empresa multinacional. Sócio-diretor da Result Gerenciamento e Organização da Informação. É autor dos livros “Indicadores de gerenciamento de projetos: monitoração contínua” (2010) e “Gerenciamento de Projetos em 7 passos: uma abordagem prática” (2011), ambos lançados pela M. Books de São Paulo.

 

 

 

 

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